Embora sejam comuns nos primeiros anos de vida, o uso prolongado de chupeta, mamadeira ou mesmo o hábito de chupar dedo podem comprometer a fala, a respiração e até a autoestima da criança. Especialistas explicam como encontrar o equilíbrio e orientar uma transição saudável.
Quando o conforto vira risco
Chupar chupeta, usar mamadeira por muito tempo ou levar o dedo à boca são comportamentos naturais para os bebês. Eles ajudam na autorregulação, trazem segurança e fazem parte do instinto de sucção, presente desde a vida intrauterina. No entanto, quando prolongados além do tempo recomendado, esses hábitos podem se transformar em desafios para a saúde bucal e até para o desenvolvimento global.
A odontopediatra Alessandra Souza explica que é natural a criança buscar sucção não nutritiva, mas o problema começa quando o hábito ultrapassa os limites. “É natural que o bebê busque sucção não nutritiva. O problema surge quando esses hábitos ultrapassam o período recomendado, pois podem alterar a estrutura da boca, afetar a fala e até a respiração”, afirma.
O que pode acontecer com o uso prolongado
Entre as alterações mais observadas pela odontopediatria estão:
- Mordida aberta, com espaço entre os dentes da frente.
- Mordida cruzada, em que as arcadas não se encaixam.
- Projeção dos dentes superiores e retração dos inferiores.
- Palato estreito, que compromete o espaço dos dentes permanentes e a respiração nasal.
Essas consequências não são apenas estéticas: envolvem funções vitais. Alterações na fala, respiração bucal e deglutição atípica — quando a língua empurra os dentes ao engolir — podem comprometer a mastigação, a comunicação e até a autoestima da criança. Em alguns casos, será necessário tratamento ortodôntico ou acompanhamento fonoaudiológico.
O que dizem as diretrizes
Segundo recomendações da Associação Brasileira de Odontopediatria (ABOPED), da American Academy of Pediatric Dentistry (AAPD) e da Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso de chupetas e mamadeiras deve ser limitado e interrompido até, no máximo, os 3 anos de idade. Quanto antes for feita a transição, melhor para o desenvolvimento orofacial.
No caso das mamadeiras, há ainda o risco adicional de cáries na primeira infância, especialmente quando usadas com líquidos açucarados ou durante o sono. Por isso, especialistas reforçam a importância da amamentação sempre que possível e incentivam a substituição gradual por copos de transição.
O olhar da pediatria: benefícios e riscos
A pediatra Mariana Jordão acrescenta nuances à discussão. Ela lembra que os bebês têm necessidade de sugar desde a gestação, e que em alguns contextos a chupeta pode ser aliada. “O uso da chupeta pode trazer benefícios, como acalmar a criança – algo que, para a família e a mãe, significa um pouco de conforto em um período de muita doação, como é o caso do puerpério e da amamentação. Além disso, a alternativa auxilia quando há ausência materna e pode até mesmo prevenir o risco de morte súbita”, reforça.
Por outro lado, Mariana alerta para o risco de introduzir bicos artificiais cedo demais. Se o aleitamento não estiver bem estabelecido, existe a possibilidade de confusão de bicos, favorecendo o desmame precoce. “Quando o aleitamento não está estabelecido, ou seja, quando há dificuldade no vínculo entre mãe e bebê, existe sim o risco de ocorrer a confusão de bicos”, explica.
Sinais como dor ou fissuras ao amamentar, redução no tempo de mamadas ou dificuldades no ganho de peso devem acender o alerta e levar à suspensão temporária da chupeta ou da mamadeira até que a amamentação esteja segura.
Como ajudar a criança a abandonar o hábito
Seja chupeta, mamadeira ou dedo na boca, abandonar esses hábitos exige paciência e empatia. Forçar ou punir a criança pode gerar traumas e resistência. Especialistas orientam algumas estratégias eficazes:
- Conversas lúdicas: contar histórias que ajudem a criança a compreender a mudança.
- Restrição gradual: limitar o uso da chupeta apenas ao momento de dormir, por exemplo.
- Reforço positivo: celebrar cada avanço como uma conquista.
- Objetos de transição: paninhos ou brinquedos que tragam segurança.
- Acompanhamento profissional: consultas de rotina para monitorar o desenvolvimento.
“O papel da família é fundamental. Com paciência, empatia e suporte adequado, essa transição pode ser leve e segura, protegendo a saúde bucal da criança a longo prazo”, conclui Alessandra Souza.
O equilíbrio que protege a infância
Chupeta, mamadeira ou dedo na boca não precisam ser tratados como vilões absolutos. Eles podem trazer conforto em fases importantes da vida do bebê, mas devem ser usados de forma consciente e dentro dos limites. O segredo está no equilíbrio, na observação atenta dos sinais e no acompanhamento de profissionais de saúde.
Com informação, empatia e boas escolhas, as famílias podem garantir que esses pequenos hábitos não se tornem grandes problemas no futuro.